sexta-feira, 8 de julho de 2016

Recortes

Você borrou meu batom. E eu não deixo meu batom vermelho sair da boca se não quiser desesperadamente beijar alguém. Mas eu quis. Desde o início, fui eu quem te quis. Eu olhei, eu cheguei perto, eu puxei assunto. Eu te levei para o bar. Fiquei impaciente esperando a sua boca encostar na minha. Mas quando finalmente aconteceu, eu soube que estava perdida. Que não deveria ter ido atrás. Não deveria ter procurado sarna pra me coçar. Não deveria ter sorrido e perguntado seu nome. Os nossos corpos se colaram e eu não ouvi mais música nenhuma. A gente se encaixou um no outro e eu estava tão costurada em você que não podia nem pensar em ir embora. Esqueci completamente que tinha gente em volta. Nem liguei pro meu rosto todo pintado de vermelho. Enquanto você brincava com a barba no meu pescoço, eu só me perguntava o que diabos estava acontecendo ali. Se não precisasse ir pra casa, acho que estaria lá até hoje. Que coisa maluca essa tal de química. Coisa que não tem receita, que a gente não consegue explicar. Coisa que simplesmente acontece e a gente não sabe dizer de onde veio. Parece até sobrenatural. A verdade é que nós nunca tivemos nada a ver e você sabia ser mais terrível do que qualquer outro cara que já tinha cruzado meu caminho, mas quando eu te avistava em algum lugar e sentia seu cheiro, simplesmente sabia que ia te deixar borrar meu batom de novo.

***

Com você eu tinha absolutamente tudo a ver. Pena que só no fim eu pude constatar aquilo que já desconfiava desde a primeira vez que te vi: nós dois poderíamos passar horas conversando e ainda assim ter assunto. E isso de tão bom chega a ser assustador. Sempre achei que há algo perigosamente mágico nessas conversas intermináveis. A gente sempre acaba dividindo coisas profundas que deveria manter bem escondidas. Mas você apareceu quando minha cabeça estava um turbilhão, quando meus pensamentos tinham outro protagonista. E só reapareceu quando eu já não tinha mais tempo. E aí não deu outra e eu fiz o que faço de melhor: fugi. Ou melhor, tentei fugir. Porque você sempre me alcançava com esse sorriso meio safado e esses olhos de menino que quer ser abraçado pelo mundo. E me provocava, me apertava, não queria me deixar ir. E quando eu puxei teu lábio inferior com os meus naquele último dia, te senti prestes a perder a razão. Será que eu estava certa? Acho que nunca vou descobrir. Sabia que no dia seguinte o cheiro do seu cabelo ainda estava nas minhas mãos? Acho que você nunca vai saber. Por aqui ficou um gostinho de "e se...", um gostinho do que poderia ter sido e não foi, um gostinho de história sem fim. Mas eu notei em você uma vontade imensa de viver e aquilo me inspirou. E é isso o que mais me atinge quando me lembro.

Love, Tary

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Vinte músicas e muitos gifs

Nunca antes na história desse blog responder um meme foi tão difícil. Dia desses menina Rafitcha me indicou a TAG 20 Músicas, trazida para o Brasil pela Karol Pinheiro, e sinceramente eu achei que não ia conseguir. Olhava para as categorias e não fazia a menor ideia do que escolher. Ou tinha tantas possibilidades em mente que ficava maluca, sem conseguir me decidir. Mas saiu. E devo dizer que acabou sendo muito divertido. Preparem-se para surpresas, nostalgias e muitos, muitos gifs.

1) Sua música favorita

E eis que a primeira categoria já me deixou paralisada na frente do computador, claro. Praticamente todos os meses eu tenho uma nova música favorita. Fiquei umas boas horas refletindo e meu primeiro pensamento foi “Something”, dos Beatles, por motivos de: a música mais bonita do mundo. Mas a verdade é que não escuto há séculos e não tenho nenhuma conexão transcedental com ela. Ao contrário de Stop This Train, do John Mayer. É uma canção que vira e mexe eu PRECISO ouvir para ter certeza de que alguém nesse mundo entende como é difícil crescer e lidar com tudo o que esse processo maluco envolve. Um dos mantras da minha vida.

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2) A música que você mais odeia

Vocês vão ver abaixo que não tenho absolutamente nada contra sertanejo. Mas eu lembro direitinho do quanto essa música grudava na minha cabeça e se recusava a sair toda vez que começava a tocar. Era um nightmare absoluto. Só de pensar no nome ela já ameaça se instalar no meu cérebro. Estou falando de Mozão, do Lucas Lucco. Gente. Desenvolvi uma espécie de fobia ao vocal sussurradinho, ao sotaque carregado do moço, à letra, tudo. Tanto que, quando eu ouvia os primeiros acordes na rádio, já trocava de estação. O clipe tem toda uma mensagem legal, com depoimentos de mulheres que venceram o câncer, mas não consigo gostar da música.

3) Uma música que te deixa triste

Já cheguei a descrever essa como “a música mais triste do meu mundo”. Anos se passaram e nada mudou. Clarisse, da Legião Urbana, continua sendo a coisa mais deprimente que já ouvi na vida. Quando Renato Russo canta “e a dor é menor do que parece, quando ela se corta, ela se esquece”, eu já estou em posição fetal, pensando em todas as pessoas tristes que se sentem sozinhas e incompreendidas. São longos minutos de total desesperança e descrença na humanidade, até o final. “Eu sou um pássaro, me trancam na gaiola, mas um dia eu consigo existir e vou voar pelo caminho mais bonito”. Clarisse me dói tanto que só consigo ouvir, sei lá, uma vez por ano. Mas vale à pena. Pura poesia.

4) Uma música que te lembra alguém

Veveta é uma das poucas artistas a se dividir confortavelmente entre rainha suprema do Axé e diva da MPB. A maioria das músicas dela me remete à minha família. Se tem uma cantora que domina as festas lá de casa, essa cantora é Ivete Sangalo (o que sempre gera reclamações de uma das minhas tias, enquanto eu e minha irmã fingimos não ouvir). Porém, uma canção em especial me faz lembrar de - veja só você - meu primeiro amor. Demorei uns 8 anos pra conseguir escutar Deixo, mas a tristeza passou. Agora só sinto  uma melancolia bonita, misturada com a nostalgia dos meus 15 anos. Digam o que quiserem, a letra é uma das mais bonitas já feitas.

5) Uma música que te deixa feliz

Assim que o verão acabou na Irlanda, tudo o que eu ouvia era Banda do Mar. Aquelas canções bonitas me lembravam de casa, me devolviam o calor do Brasil e melhoravam os meus dias mais cinzentos. Lembro de ter escutado Mais Ninguém pela primeira vez numa house party inesquecível e precisei conferir o CD inteiro no dia seguinte. Essa música é capaz de levantar meu astral imediatamente, de um jeito delicioso. Sinto vontade de dançar na grama de pés descalços e girar por aí usando um vestido bem rodado.

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6) Uma música que te lembra um momento específico

Mais uma vez: são tantas. Mas ontem mesmo eu estava na casa de algumas amigas, colocamos o CD do Ed Sheeran para tocar e quando Tenerife Sea começou, eu contei a elas o quanto chorei ao ouvir essa canção ao vivo durante o show dele, no ano passado. Foi uma das coisas mais emocionantes que eu já presenciei. Parecia que existia uma aura diferente em volta do Ed, sabe? Meu corpo inteiro se arrepiou e eu tive certeza de que estava diante de uma coisa muito especial, única. Você pode ver o vídeo e achar que é só um cara com um violão. Pra mim, aquilo foi mágica.

7) Uma música que você sabe a letra inteira

Eu obviamente tinha várias outras alternativas, mas acho assombroso o fato de ainda saber cantar cada palavra do hit Tem que Valer, da banda Kaleidoscópio, lançado em 2005 (!!!!!!) . Não se engane. Você já ouviu essa música. Clique no link e verá. Mas se não quiser, eis um trecho inconfundível: “Rolei na areia e fiquei louca, muito louca”.

8) Uma música que te dá vontade de dançar

Não sou fã da Beyoncé. Calma, isso não quer dizer que desgosto. Só não colocaria no meu TOP 5 divas pop, sabe? Acho foda, sei da importância, rebolo muito a bunda quando a voz dela ecoa na balada, mas não iria no show por exemplo (todo mundo se matou pra comprar ingresso aqui em Dublin e eu só queria mesmo é conseguir um pra ver a Adele). No entanto, minha gente. NO ENTANTO. Existe um acontecimento. Um acontecimento chamado Love on Top. Isso não é uma música. Isso é um hino. Fico louca toda vez que os péssimos DJs dessa cidade me presenteiam com – alerta breguice - esse diamante em forma de canção.

beya

9) Uma música que te faz dormir

Espero que isso não seja entendido como ofensa. Amo muito a Norah Jones, mas suas canções são perfeitas para deixar rolando enquanto o sono não vem. Por isso, vamos de: Don’t know why. Desde de Mulheres Apaixonadas e para todo o sempre, amém.

10) Uma música que você gosta em segredo

Só é segredo mesmo porque eu nunca disse aqui. Gente, eu adoro o Michel Teló. Há anos. Fui grande fã do Grupo Tradição (importante lembrar que tenho sangue sul-mato-grossense), que ele liderava antes de estourar com a carreira solo e sempre torci pra que tudo desse muito certo pro Michel. E deu, né? Fiquei sorrindo de orelha a orelha na primeira entrevista com o Jô, na época de "Fugidinha", "Humilde Residência" e “Ei, Psiu, Beijo, Me Liga”. Defendi e ainda defendo dos chatos que reclamam do sucesso de "Ai se eu te pego" (vergonha eu teria é de ser chata que nem todos vocês ). Tô louca pra ter show dele em Campo Grande quando eu voltar pro Brasil (quero selfie). Shippo forte o relacionamento com a Thaís Fersoza (louca pra ele colocar logo no YouTube o sambinha delicioso que fez pra ela). E morro de amor quando ele toca sanfona. No DVD novo, Michelzinho canta com nada mais nada menos do que o Grupo Tradição.  A sanfona chorou. E eu vibrei como se tivesse 14 anos de novo. Além disso, no Bem Sertanejo, projeto que descobri recentemente, ele canta vários clássicos do sertanejo raiz com convidados especiais. Chorei quando ele apareceu com Almir Sater e Jads & Jadson? Chorei sim. Música favorita: todas ¯\_(ツ)_/¯. Beijo pra quem não conseguir lidar com essa informação.

micheltelo

11) Uma música que você se identifica

O albúm inteiro da Sandy me causa uma identificação maravilhosa, mas Sim é covardia. A letra casa perfeitamente com o que aconteceu comigo de 2015 pra cá. “Eu disse sim pro mundo, eu disse sim pros sonhos e pra tudo o que eu não previa”. Escutar essa música foi como reencontrar uma velha amiga de infância, na mesma situação que eu, me dizendo que “eu podia mais do que eu sabia”. Ainda bem que ainda temos você, Sandy. Obrigada.

sandyy

12) Uma música que você amava e agora odeia

Pobre Sara Bareilles. O único motivo para eu detestar a anteriormente amada Bottle it Up é que um belo dia inventei de colocar essa música como despertador do celular. Aí não teve jeito.

13) Uma música do seu disco favorito

Decidi que vou mencionar uma música do meu atual disco favorito, que é E.MO.TION, da Carly Rae Jepsen. Não paro de ouvir e quanto mais eu escuto, melhor fica. Ainda não me conformo com o quanto esse pequeno milagre do pop foi subestimado pela mídia. Entre todas as minhas muitas favoritas, gostaria de indicar Run Away With Me. Essa maravilha ficará na sua cabeça o dia todo, mas de um jeito BOM, que vai te fazer dançar pela casa de pijama com uma escova de cabelo no lugar do microfone. Apenas ouçam.

14) Uma música que você consegue tocar em algum instrumento

Risos. Eu obviamente não sei lidar com instrumento algum. Sério, acho que não sei nem como segurar um instrumento direito. Já contei aqui que meu sonho é aprender a tocar gaita. E se um dia isso acontecer, minha escolha seria a versão do Beck para True Love Will Find You in the End. A gaita faz por essa música o mesmo que um bom achocolatado faz pelo brigadeiro nosso de cada dia.

15) Uma música que você cantaria em público

Por algum motivo que só Deus e Freud podem explicar, me veio à mente essa cena icônica de Crossroads, com Britney Spears fingindo insegurança de um jeito super convincente (só que nunca) e cantando I Love Rock’n Roll. Também quero sensualizar no palco de barriga de fora enquanto giro num belíssimo pole dance.

16) Uma música que você gosta de ouvir quando está dirigindo

Risos de novo. Não dirijo há quase três anos. Vou substituir por “uma música que gosto de ouvir quando estou andando na rua com meus fones nos ouvidos”. Geralmente é alguma coisa da playlist do momento, mas sempre quando passo um batom vermelho e estou me sentindo poderosa, pode ter certeza que Mallu Magalhães está cantando Velha e Louca.

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17) Uma música da sua infância

Pensei em Sandy & Junior (moldaram meu caráter), Wanessa Camargo (de quem eu tenho os dois primeiros CDs originais, acredite se puder), Rouge (fiz uma apresentação de Asereje para toda a família, juntamente com várias das minhas primas) e Br’oz (sim, sim, sim, você é minha prometida e eu vou gritar pra todo mundo). No fim das contas, decidi ir mais longe no passado. Lua de Cristal, da Xuxa. Minha emoção quando o filme era anunciado na Sessão da Tarde não era desse mundo. Eu ficava tão genuinamente feliz, era lindo. E se você não consegue enxergar a beleza dessa canção maravilhosa, só consigo sentir pena da sua alma. Importante ressaltar que não só marcou minha infância, como é minha primeira escolha se um karaokê estiver disponível.

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18) Uma música que ninguém esperava que você gostasse

Depois da revelação sobre o Michel Teló, acho que perdi o shock value, mas ainda posso dividir com vocês, mesmo que fora de timing, minha música favorita de Carnaval: Praeiro, do Jammil. Sei cantar inteirinha (não só o refrão), obviamente danço a coreografia e acho que deveria tocar mais em festas. “Sou praieiro, sou guerreiro, tô solteiro, quero mais o quê?” Não dá pra querer mais nada depois disso mesmo.

19) Uma música que quer (ou tocou) no seu casamento

Desde que ouvi Pra você guardei o amor, de Nando Reis e Ana Cañas pela primeira vez, o verso “pra você guardei o amor que aprendi vendo meus pais” nunca mais saiu da minha cabeça e eu tive certeza de que essa música estaria no meu casamento.

20) Uma música que tocaria no seu funeral

Eu sempre digo que quero Cazuza tocando no meu funeral. E os trabalhos devem começar com Faz parte do meu show. Essa é uma das letras mais bonitas do Caju e conta a história de alguém “meio bossa nova e rock n’ roll”, que vaga na lua deserta “nas pedras do arpoador”. De um jeito que nunca vou conseguir explicar, eu sinto que a vibe dessa música tem tudo a ver comigo. Seria lindo que as pessoas se despedissem de mim escutando algo que eu amava.

cajuzinho

Agora vou passar essa roubada maravilhosa para Palo, Cacau e Couthinha. Vou adorar conhecer as 20 músicas de vocês, meninas. E preciso desejar boa sorte desde já: apesar de muito divertido, o trem é difícil.

Love, Tary

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

A minha maior insegurança, empatia e um recado

Faz tempo eu quero escrever sobre a maior das minhas inseguranças, mas sempre acabo adiando essa conversa. Voltar para uma época complicada da sua vida pode ser um processo extremamente doloroso e exaustivo. Por conta disso, quando a vontade de abordar esse assunto aparecia, eu me forçava a esquecer e escolhia alguma opção mais leve. Porém, de uns dias pra cá, a ideia de que esse texto pode ajudar alguém não para de martelar na minha cabeça. E, de algum modo, eu devo essas palavras à menina que eu fui um dia e tanto precisou delas.
 
Onze anos atrás, mais ou menos, eu  comecei a sofrer bastante com a acne e isso durou até o início da vida adulta. E eu sei que muita gente acaba de revirar os olhos e pensar: “Ah, todo esse drama por causa de algumas espinhas? Que bobagem!”. Só digo uma coisa: quem pensou isso, com toda a certeza do mundo, não teve um caso severo da doença (sim, é uma doença. A 8ª mais comum em todo o mundo) nem conviveu de perto com alguém que passou por isso. Além de ser um grande baque na autoestima, ela costuma aparecer justamente naquela fase em que não precisamos mesmo de mais um motivo para nos sentirmos mal a respeito das nossas aparências.
 
Comigo foi assim. Eu me comparava com as garotas da minha sala, passava horas olhando disfarçadamente àquelas peles livres do que tanto me atormentava. Eu invejava quem tinha a “sorte” de ter uma ou duas e me encolhia quando elas vinham se queixar comigo – justamente comigo –, como se ir reclamar com alguém que está em uma situação pior as reafirmasse. Hoje eu enxergo que elas eram tão inseguras quanto eu, mesmo que os motivos fossem diferentes, mas não consigo deixar de me perguntar o porquê dos comentários. Ah, os comentários. Meu pai sempre diz que quem bate esquece, mas quem apanha jamais esquece. Não preciso fazer esforço algum para deixar as memórias voltarem. Lembro de tudo. 
 
Do dia em que uma amiga veio até mim na hora do intervalo e parou nossa conversa no meio só para dizer: “Nossa, sua testa tá coberta de espinha”. Do dia em que a mais bonita da classe fez cara de pavor enquanto me questionava: “Gente, o que aconteceu com a sua pele?”. Do dia em que, na capela da escola, uma colega com pele de bebê pediu: “Ai, espreme isso aí que tá nojento”. Do dia em que o menino que tinha acabado de me beijar olhou para o meu ombro e perguntou: “Nossa, pura espinha, hein? Você não cuida?”. É engraçado como é difícil recordar certos detalhes desse tempo, mas ainda sei repetir cada palavra dessas frases.
 


Apesar das minhas lesões não serem tão graves quanto a dos meus primos, por exemplo, que deixaram sinais bem profundos na pele, nada do que eu fazia acabava com elas por completo (mais tarde eu descobri que isso tem nome: “acne resistente”). As espinhas podiam não ser grandes, mas eram muitas. E doloridas. Algumas noites, no escuro, eu tocava o meu rosto e começava a contar. Uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, dez… E nunca conseguia terminar porque as lágrimas me interrompiam. Houve um período em que eu não queria mais sair de casa, evitava fotos, passava o menor tempo possível me olhando no espelho, andava de cabeça baixa, não parava de ter pensamentos ruins. Era hora de procurar ajuda. Agradeço muito aos meus pais por terem entendido que “não eram só espinhas” e me levado ao médico. Façam o mesmo pelos seus filhos, por favor.
 
Passei por vários e vários dermatologistas, que me receitaram todo tipo de medicamento tópico que vocês imaginarem. Eu usava cada um deles com precisão militar e morria de frustração quando as espinhas não iam embora. Melhoravam, é verdade, mas sempre voltavam. Até que finalmente encontrei uma dermato de quem gostava e, depois de prescrever diversas opções, ela viu que os tratamentos convencionais não estavam funcionando. Foi aí que veio a sugestão de tentar o tal remédio fortíssimo (e bastante eficaz) sobre o qual eu havia lido algumas vezes.
 
Acho que comecei a tomar a Isotretinoína (ou Roacutan, como é mais conhecido) algum tempo depois do meu aniversário de 15 anos. Não quero me estender em detalhes técnicos, mas o remédio é extremamente forte e pode causar muitos efeitos colaterais. É preciso fazer exames de sangue mensalmente porque ele pode desregular as taxas do organismo, além de teste de gravidez (existe risco grave de malformação do feto e um termo de conhecimento de risco acerca disso era assinado pelos meus pais, por eu ser menor de idade na época). Tomei durante um ano e precisei tomar novamente, já adulta, quando a acne voltou (e começou a aparecer nas costas e no colo, lugares onde nunca tinha se manifestado antes). Na segunda vez, senti bem mais os efeitos do remédio e dei graças a Deus quando finalmente acabou (NÃO é brincadeira e passa longe de ser fácil. NÃO é uma escolha leviana. E não é à toa que geralmente é a última alternativa dos médicos. Parem de tratar esse remédio como se nada fosse, pelo amor de Deus). E então acabou. Eu estava livre, finalmente. Será?
 
Minha avó conta que a tática perfeita para me fazer comer legumes quando pequena era dizer que “eram bom para a pele”. Nunca liguei tanto para o meu cabelo (apesar de ter tido problemas com ele na adolescência também), ou tive grandes complexos com o corpo, mas sempre sonhei em ter uma pele linda. Hoje em dia, nada é mais libertador para mim do que sair por aí sem maquiagem. Há alguns dias, quando fui testar uma base na MAC e a vendedora disse que eu só precisava da mais leve – “Because your skin is gorgeous” - , meu coração se aqueceu por alguns segundos, mas só consegui pensar na versão mais jovem de mim. Aquela moça não fazia ideia de tudo o que ela passou para que a Taryne de hoje, anos depois, pudesse ouvir isso. As maldades que escutou calada, a quantidade de tempo (e dinheiro) gasto em dermatologistas, o sofrimento com os tratamentos. Minha vontade era voltar no tempo e dizer: “Tary, você já é linda. Muita gente vai dizer o contrário. Não acredita. Você é linda, você é linda, você é linda. ‘Bonita é ser você’. E um dia você não vai precisar que ninguém te diga isso”.
 


Todos os dias aprendo mais um pouco sobre a importância de me amar, de ter cuidado comigo mesma. Muita coisa mudou no decorrer dos anos que me separam daquela menina que chorava no chuveiro depois de ouvir crueldades mal disfarçadas. Eu me sinto bonita. Mas algo ainda gela dentro de mim quando uma espinha aparece no meu rosto. Não tenho muitas cicatrizes físicas da acne. As pessoas geralmente se impressionam quando conto que fui uma adolescente cheia de espinhas, mas as marcas emocionais sempre estarão aqui. E às vezes ainda doem.
 
Quem sofre de acne sabe que ela está ali. Provavelmente se torturou contando as lesões, como eu fazia. Chorou na frente do espelho e rezou para que aquele corretivo ajudasse a cobrir. Rezou para que, pelo menos naquele dia, naquele único dia, fosse deixada em paz. Qual é o motivo de relembrar algo que a pessoa está cansada de saber, como se ela fosse culpada?  Nunca façam isso. Sério. Nunca. Vocês não têm noção das consequências*.
 
E isso me leva à empatia. Não precisa ser um gênio para saber que muitos dos problemas do mundo se resolveriam se as pessoas fizessem o exercício de se colocar no lugar umas das outras. Parece tão simples, não é? Basta parar e refletir. Eu gostaria que me falassem isso? Eu gostaria que fizessem isso comigo? Será que vai magoar? Leve isso tudo em conta antes de ser responsável pelo sofrimento de alguém.
 










Agora, por último, quero falar diretamente com quem está passando pelo que eu relatei aqui. Primeiro de tudo, me abraça bem apertado. Como você leu acima, sei exatamente como é. Eu entendo. Eu sei que não é besteira. Eu te abraço (sim, mais uma vez).

Segundo: VÁ AO DERMATOLOGISTA! Desculpa pelo caps lock, mas só seu médico vai saber o tratamento certinho para o seu tipo de acne. Se você for adolescente, converse com seus pais, explique o porquê de ser importante (mostre esse post). Escolha um dermato bacana e confie nele.

Terceiro: Ninguém é obrigado a conviver com gente que aponta suas inseguranças deliberadamente. Ter espinhas não é culpa sua, como querem te fazer acreditar. Se essa pessoa for uma amiga, ou um amigo, explique que esse tipo de comentário magoa. E se não for o suficiente, se afaste. Você não precisa estar perto de quem te coloca para baixo.

Quarto: Isso pode ser clichê, mas preciso dizer mesmo assim. Vai passar. Seu tratamento vai dar certo. Tem solução. Não perca a esperança. Meu contato está aqui do ladinho se precisar de mim <3

Quinto: Mesmo quando as suas espinhas forem embora, as pessoas ainda vão arrumar razões para te julgar e te fazer sentir sem valor. Por isso preciso que leia isso o que eu tenho a dizer em seguida com bastante atenção, tá? Você é um ser humano lindo, eu sei. E mesmo sem te conhecer, me dou o direito de te enviar todo o meu amor. Eu te abraço (pela terceira vez e quantas mais você precisar).
 
Vídeo maravilhoso que me faz chorar horrores. Assistam!
Love, Tary

* Não posso falar com propriedade sobre várias outras inseguranças, porém aposto que elas cabem aqui também.
 
P.S: Por ser um texto muito pessoal, pensei se não devia postar na minha newsletter semana que vem, mas acho que estar aqui aumenta as chances de ajudar alguém que esteja passando por isso, quem sabe.

P.S2: Dedico esse post à minha irmã, que infelizmente (e eu rezei tanto para que isso não acontecesse), também teve um caso grave de acne na adolescência. Gio, eu te amo. Sei que você, mais do que ninguém, vai entender o propósito desse texto.

sábado, 23 de janeiro de 2016

Mas tudo bem

Quando a minha flatmate perguntou qual era o propósito de criar uma newsletter, eu disse que nem eu mesma sabia direito, mas todas as minhas amigas estavam fazendo e acompanhar a vida daquelas malucas nunca é demais. E foi bem isso. Apareci no nosso grupo do WhatsApp e a folia estava armada. Todas estavam conversando animadamente sobre esse trem que eu tinha zero ideia de como funcionava. Me mandaram ler o - maravilhoso - post de Anna Vitória, onde ela responde o que raios é newsletter e indica suas favoritas. Fui conquistada pelo frenesi coletivo, me inscrevi em várias, criei a minha e até já inaugurei, acreditam? 

Vou explicar o que eu entendi do negócio e vocês me corrijam se eu estiver errada. Quando você assina, os textos são enviados diretamente para sua caixa de entrada, quase como cartas da era moderna, ou tweets sem limite de caracteres. É meio isso, não? Ainda estou aprendendo. Mas achei fantástico saber que estou sendo lida sem depender do número de comentários, por exemplo. Apesar de ter consciência de que tenho leitores-fantasma por aqui, não tenho a menor de ideia de quantos são ou se ainda existem (oi, vocês estão aí ou desistiram de mim a partir do sumiço número 100?). 

E a verdade é que tenho ideias de textos quase todos os dias, que morrem na minha cabeça, ou vão parar no meu journal. Às vezes são só anedotinhas sobre a minha vida de intercambista, coisas bobas sobre as quais quero tagarelar e dramédias urbanas, como gosto de chamar aqueles momentos tragicômicos que acontecem no meu cotidiano. Pareceu uma boa oportunidade de dividir essas coisas com quem quiser ler. 

O nome surgiu quando pensei na expressão que mais uso no final das minhas frases e ainda é uma bela referência à minha música favorita da Legião Urbana. "Mas tudo bem" não é apenas o refrão de Giz, mas um trending topic da minha existência. Uma mistura de conformismo quando merdas acontecem e não há nada que se possa fazer a respeito, ou do otimismo que precisei costurar em mim pra não enlouquecer. E tem sempre aquele trecho da música do Engenheiros. "Já vi o fim do mundo algumas vezes, mas na manhã seguinte tava tudo bem". Sentar na frente do meu computador pra escrever sobre minhas desventuras é prova suficiente de que tudo acabou bem e vida que segue. 

Estou empolgada com essa nova aventura e com vontade de escrever mais (lá e aqui também, juro). Ainda não tenho noção da periodicidade e linha editorial é uma coisa que jamais passou pela minha mente. Só quero experimentar e ver o que acontece. E aí? Posso aparecer na sua Caixa de Entrada de vez em quando? Clica aqui e vamos embarcar nessa juntos. 

Queria ler a newsletter da Jane Austen, e vocês?
(É sério, respondam nos comentários!)

Love, Tary 

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Seja como for, eu vou

Escrevi no Facebook e no meu journal, mas não parecia certo começar 2016 sem tirar a poeira deste blog e falar um pouquinho sobre o ano que passou. Ainda mais considerando que hoje completo seis (seis!!!) anos de Doces Rodopios. Posso ter passado grande parte desse tempo desaparecida, é verdade, mas sempre voltei. Sempre volto. E hoje dou sinal de vida pra dizer que mal posso acreditar que 2015 finalmente chegou ao fim. Foi um ano difícil, cheio de altos e baixos, repleto de tragédias e escândalos. Porém, no que diz respeito à minha humilde vidinha, estes 365 dias foram muito importantes. Olhando para trás, parece que vivi mil vidas.

Comecei o ano pedindo demissão e passei meses sem saber o que raios iria fazer em seguida. A expressão “mixed feelings” nem começa a descrever o que aconteceu dentro de mim depois desse passo gigantesco. E no fim das contas, os patos se enfileiraram. Decidi atravessar o mundo em busca de mim mesma. Semprei sonhei em fazer intercâmbio e aproveitei esse momento de dúvidas angustiantes (sério, eu tava enloquecendo) pra realizar esse desejo. Sabe quando você sente que, se não fizer algo “agora”, talvez nunca mais tenha essa chance?

Mas antes de desembarcar em Dublin, a missão de surpreender a noiva do ano precisava ser cumprida. Eu e minhas amigas alugamos um apartamento no Rio de Janeiro, fomos juntas para a balada (pela primeira vez, já que sempre preferimos bater papo de pijama) com coroas típicas de despedida de solteira, ostentamos bolo e champanhe e passeamos na Urca <3 (não consigo escrever Urca sem colocar um coração do lado, me perdoem). E em junho, Couthinha casou. Na cerimônia mais linda que meus olhos já viram. Nós fomos damas, seguramos buquês e choramos horrores, como esperado. Ainda não consigo explicar o que aconteceu naquele dia. Parece um sonho que sonhamos em conjunto. E de certo modo, foi mesmo.

Então, depois de alguns dias, meus pés tocaram a Ilha Esmeralda. O último texto traz um bom resumo dos meus primeiros 100 dias aqui, mas teve muito mais. Um Halloween de verdade, com todo mundo fantasiado nos pubs do Temple Bar. Caminhadas de mais de 30 quilômetros em busca de emprego. O fim do meu curso de inglês. Trabalho voluntário. A decisão mais difícil que já tomei em 24 anos. Um Natal longe de casa com direito à ceia farta, amigos pra vida inteira e o coração quebrado de saudades.

E tem quem pense que intercâmbio é glamour. Essa experiência tem mais suor, lágrimas, bolha no pé e dor de cabeça do que as pessoas imaginam. É um tal de passar a semana comendo porcaria porque não dá tempo de almoçar em casa (e nem se tem dinheiro pra comer bem em algum restaurante). Não fazer coisas simples, que no Brasil faziam parte do cotidiano, como comprar uma roupa só porque achou bonita, ou pegar um táxi só porque está chovendo muito. Intercâmbio é sacríficio. É escolher prioridades. É poupar hoje pra ter amanhã. Não é fácil estar aqui. E mais difícil ainda foi escolher ficar mais um pouco. A saudade da minha família aperta tanto que às vezes sinto vontade de pegar um avião e correr para os braços de quem mais amo nesse mundo. Ficar é colocar em prática o exercício da renúncia todos os dias, mas também significa abraçar uma vida que só posso ter aqui. E que vai ficar aqui quando eu voltar.

Ah, só mais uma coisa. No dia 31 de março, em pedaços, eu postei o seguinte: “(…) nunca quis tanto: escrever, me apaixonar e viajar por aí. Apesar de não me considerar boa ou preparada o suficiente para nenhuma dessas coisas.” E adivinhem só? Todas essas coisas aconteceram em 2015. Eu continuei documentando tudo no papel (completei um ano mantendo um journal), estou morando na Irlanda há seis meses e… me apaixonei. Foi bem diferente dos filmes da Disney (essas músicas dizem tudo, caso alguém esteja curioso) e passou longe de se tornar amor, mas não me arrependo de absolutamente nada. Pelo contrário, tenho certeza de que tudo o que me permiti viver (e sentir) vai refletir no “daqui pra frente”. Já dizia o Poetinha que o amor da nossa vida é feito de todos os outros que a gente teve.

Terminei 2015 me sentindo grata, infinita e, principalmente, orgulhosa de mim. Eu provei  que consigo me virar. Me dei um voto de confiança. Acreditei que podia. Nunca corri tantos riscos em tão pouco tempo. Tive que driblar a indecisão e fazer escolhas complicadas. Experimentei o gosto da coragem e pedi mais. Chorei, sofri, me perdi, mas meu Deus do céu, como eu vivi.

Se a Taryne do futuro tivesse contado para a Taryne do passado tudo o que a aguardava, ela provavelmente morreria de rir, incrédula. Não faço a menor ideia do que 2016 me reserva. Só quero aprender ainda mais. Colecionar memórias bonitas e experiências desafiadoras nessas páginas em branco que agora parecem tão intimidadoras. Mas seja como for, eu vou. Estamos indo. Boa jornada para todos nós!

Alguns dos melhores momentos de 2015

Love, Tary