sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Eu gosto do gosto da coragem

Faz meio ano que não escrevo aqui. Parece exagero dizer isso, eu sei. Mas é a verdade. Seis meses desde o último post. Quem acompanha minha vida somente através deste blog não faz ideia do que raios aconteceu desde março de 2015. E, meu Deus, aconteceu tanta coisa. E quanto mais o tempo passou, mais coisas foram acontecendo e aí só ficou mais difícil voltar. Não sei se existe um breve resumo possível, mas vou tentar. Em abril, eu decidi que era a hora certa de fazer um intercâmbio. E do momento em que fechei o contrato com a agência até a data da minha viagem foram menos de 45 dias.

Vocês conseguem imaginar a quantidade de sentimentos que fizeram a festa dentro de mim durante esse período? Nem tive muito tempo para processar todos eles. No dia 26 de junho, por mais louco que isso ainda me pareça, eu desembarquei em terras irlandesas. Isso mesmo. Estou vivendo em Dublin há quase quatro meses. Mas a sensação é de que já estou na Ilha Esmeralda há um ano. Tudo é tão intenso nesse lugar. Parece uma realidade paralela onde cada acontecimento é amplificado ao extremo. Amizade de duas semanas vira irmandade. Aniversário longe da família é a pior das mortes horríveis. Você vê o fim do mundo algumas vezes e, horas depois, se sente capaz de alcançar o céu.

Lembram da garota com uma bebida na mão e um sorriso no rosto, que se joga na pista de dança como se ninguém estivesse olhando? Ela apareceu muito por aqui. Descobri que gosto tanto de sair pra me divertir quanto de ficar em casa vendo filme com as minhas flatmates. Existe lugar para as duas coisas e nenhuma precisa valer mais do que a outra. Eu entendi que sei me virar muito bem sozinha. Compro e preparo minha própria comida todos os dias. Uso o GPS ao invés de ligar para o meu pai. Vou a pé para todos os lugares que pretendo ir. Divido um flat com outras duas pessoas que conheci aqui. Só dependo de mim mesma. E isso traz um frescor de liberdade que todo mundo precisa experimentar.



Em 100 dias de Irlanda eu aprendi que não dá pra se sentir totalmente seguro em lugar nenhum do mundo, mas isso não pode me impedir de voar. Aprendi que posso me permitir gostar de alguém e viver isso sem medo. Fazer e dizer o que achar que devo, mesmo que as coisas terminem do mesmo jeito que começaram: por acaso. Prefiro as lembranças de beijos na chuva do que meu coração protegido de antes. Passei anos prometendo a mim mesma que iria sair de casa e viver. Isso nunca foi tão real quanto é agora.

Eu vi um show do Ed Sheeran depois de uma loucura pra conseguir o ingresso  e chorei ao escutar Tenerife Sea ao vivo. Adicionei os Cliffs of Moher à minha lista de “coisas mais lindas do mundo”. Me apaixonei pelos parques de Dublin. Tirei uma selfie com o Oscar Wilde. Encontrei num livro a descrição do lugar sombrio em que eu havia acabado de colocar os pés. Entreguei flyers por 20 euros e uma pizza. Vivi momentos dignos de comédias românticas com protagonistas destrambelhadas. Precisei lidar com várias despedidas. Além de intenso, tudo acaba sendo muito efêmero no intercâmbio. Pessoas que entram e saem das nossas vidas. O bonito é que muitas delas deixam marcas inesquecíveis.

Sinto falta do Brasil. Não tenho o quarto da minha irmã ao lado do meu. Nem abraço de mãe quando as coisas dão errado. Nem meu pai me chamando de “branca”. Mas me sinto forte. Não sei como. Não sei de onde vem. Vou superando cada obstáculo que insiste em supor que eu não deveria ter vindo. Eu sei que, neste momento, meu lugar é aqui. Aqui, onde eu aprendo a cada dia. Aqui, onde eu às vezes olho em volta e nem acredito. Uma aventura que eu não fazia ideia de que iria escrever este ano e já acumula tantas páginas. As folhas em branco me assustam um pouquinho, eu admito. Ainda não sei qual vai ser a história que elas vão abrigar. Acordo e vou dormir com um milhão de dúvidas na minha mente. Só sei que provei uma boa colherada dessa tal de Coragem e quis repetir. Eu descreveria o sabor como agridoce. Nem sempre acordo cedo, ou me sinto ótima, mas com certeza a melhor viagem é seguir a trilha que eu abri.




Love, Tary